Wednesday, March 17, 2010

Beterrabas Inferênciais.

Estava ali, descascando-as e não resisti. Vim prá cá. Foram tantas as inferências e os simbolismos aderidos ao gesto que resolvi descrevê-los e assim os esqueci. E não estou mais lá rindo de mim mesmo e de outros por diferentes, mas mesmos motivos. De mim por descascar beterrabas, conquanto seja muito mais fácil ordenar que me sejam servidas, lindas, num prato que não irei lavar.

Também verdade que são fáceis de fazer quando o processo está no final, no bulbo beterrábico. Antes, na formação da comidinha, são no mínimo meses de cuidados e esperanças de que chova e de que não chova, de que as formigas não sejam tantas e quantidade de coisas não exatamente aleatórias se concretizem em tempos aceitáveis para vegetal daquela cor ou de qualquer outra.

Então: o trabalho humano envolvido na beterraba que eu estava divertidamente descascando tem de ser a resultante de uma maluquice matemática qualquer que, em algum momento, envolverá teu tempo e o meu. Eu escrevendo e tu lendo sobre isso.

Transformar o mundo em algo tão confortável quanto é para nós, os sobrenadantes, mesmo considerando os “classe PT”, é grotescamente caro.

Isso uma batata, uma beterraba, já a complexidade de uma lixa de unha pode envolver a exploração de trabalho escravo na China.

Tuesday, March 16, 2010

Vídeo-clipes.

Por força de interesse no assunto música popular tenho assistido aos canais de música. Melhor diria de clipes musicais. A mesmice é uma regra, mas, suspeito, o público não nota porque a produção é de uma perfeição notável. O jeito americano de fazer: se é show, então show. Todo mundo bonito, dançando como se pássaros rítmicos e sacudidos fossem. Mas é só. E suficiente. E se é “suficiente” é isso que a indústria do show vai atrás, produz e oferece. É mais comum, não precisa garimpar.

Mais ou menos como o cachorro-quente da esquina. O ponto é bom, o pessoal vem comer, então logo serão dois três e repartindo o mesmo publico. O cara da primeira carrocinha criou o ponto, a indústria comprou todos os outros por perto e botou os empregados dela a fazer cachorro-quente. Tem até mais glamour, mais show e são muito mais baratos, são quase de graça.

Mas tem também o absolutamente escroto, o muito ruim, o que todos podem fazer e que se torna sucesso exatamente porque é tão desgraçado que justifica qualquer um se sentir artista. Muitos gostam de se sentir possíveis artistas, ainda que tão ruins ou piores do que aqueles que ouvem. E estes a indústria também multiplica. Mais barato ainda.

Monday, March 08, 2010

Chaplin.

Totalmente inverossímil, pelo menos tanto quanto o Cebolinha ou Capitão Marvel, o terno vagabundo que nunca conseguiu me extrair nenhuma risada, mas ternura sim e muita, foi a única criação do Chaplin.

O personagem é muito maior que o enredo, as histórias são tão bobas que deveriam enfurecer a crítica, mas como nas óperas (onde o que conta é a música, não trama ou texto) isso não acontece, tal a densidade do personagem. Podemos ser monstros desumanos, cretinos, desalmados, querendo a morte de alguém por uma herança, mas o carinha da bengala não é e somos todos um pouco como ele.

Ou, pelo menos, como gostaríamos que todos os outros fossem. Tão tolos. Como, do ponto de vista do Chaplin, fomos todos.

Wednesday, March 03, 2010

Gruons & Gruoffs.

Um dia, finalmente, chegaram à conclusão que as raças, Gruons e Gruoffs teriam de viver separadas. Foi um longo caminho. Evoluíram junto.

Até que os Gruons e os Gruoffs descobrissem que eram raças separadas por um abismo maior que o existente entre quaisquer duas espécies da ampla variedade de seres vivos em toda volta do planeta Granshlung, demorou. E depois demorou mais.

Os Gruons são uma raça coletiva e, portanto, altruísta, mas seus indivíduos se desenvolvem a partir de determinados Gruoffs por ainda não se sabe qual conjuminância de eventos genéticos e/ou outros.

Os Gruoffs são individuais, nunca se associam por outra coisa que não seja interesse próprio, aceitando-se aqui equipe como forma de aumentar a satisfação dos desejos individuais.

Inicialmente os Gruons se destacavam facilmente de vez que eram capazes de acessar, desenvolver e manter o conhecimento da espécie principalmente pelo interesse nisso. Dominavam.

Depois os Gruons acreditaram que instruindo os Gruoffs todos seriam mais felizes. Foi assim um tempo. Os Gruons esclarecidos até obrigavam os Gruoffs a estudar o conhecimento da espécie coisa que não tinha e não tem, para eles, o menor interesse além do econômico.

Ignorando essa diferença fundamental e na tentativa de organizar uma comunidade assim composta, os Gruons chegaram à democracia. No início, só os Gruons votavam, mas das dissidências entre eles surgiram correntes que defendiam o direito dos Gruoffs ao voto.

Os Gruoffs, em maior número passaram a dominar a cena.

Durante um tempo isso se manteve e ambas as espécies se desenvolveram em número e tecnologia, principalmente pela acirrada concorrência propiciada pela ganância egoísta natural nos Gruoffs.

(segue)

Tuesday, March 02, 2010

Causas.

Estou cheio de causas e ainda mais de seguidores de causas.

Religiões me estarrecem.

A política é o que se poderia esperar de um sistema onde todos votam: o predomínio absoluto da canalhice e, infelizmente, também da burrice que anda junto.

É um crime contra a humanidade que, em nome da manutenção de privilégios decorrentes do crescimento econômico, se oculte da coletividade o eminente colapso da civilização sob o peso do número absurdo de seres humanos sobre o planeta.
Aqui os ecologistas se metem e nem mesmo eles tocam no assunto. Consumir renováveis é pouco! É picas!! Seria preciso diminuir o consumo e não vai diminuir até parar.

Monday, February 15, 2010

Ângulos & Perspectivas.

O longo caminho até o ponto de partida desanima em qualquer atividade. E a coisa nem é tão poética assim, porque para chegar até a raia de competição, em qualquer esporte, o caminho é não apenas enorme, exaustivo como impossivelmente difícil e assassino.

Mas é igualmente fácil de constatar que de um ponto de vista cósmico, qualquer movimento é um ir para onde já se está. Não faz nenhuma diferença o referencial onde a consciência é a única medida.

Ver o que há do outro lado do universo é ir ver o que há em meus sonhos sobre o outro lado do universo, ou na melhor, como me disse quem primeiro esteve lá. Via de regra quem primeiro esteve lá foi um teórico que pediu para um técnico ir verificar se era real o que ele informava a todos que era.

Saturday, January 30, 2010

50.000

"Cinquenta mil anos é o que se julga ser o tamanho da história evolutiva da espécie humana, do tacape ao chip. Considerando o arranjo planetário excelente, a Lua onde está e fazendo o que deve para manter o eixo da Terra no lugar exato que a vida gosta, é um tempo miserável para chegar a conclusão de que tudo foi da maneira necessária para chegar onde está e se transformando do jeito que se transforma.

O passo óbvio é permitir que o que de toda maneira opera sozinho se realize sem nossa sofrida oposição. Se no plano individual a coisa é discutível tendo em vista as diferenças físicas e mentais gritantes entre indivíduos, no plano social - por ser-lhes somatório e mescla - não é.

Sempre o que acontece é resultante de forças sociais tão complicadas, confusas, caóticas (e dai que imprevisíveis) quanto, por exemplo, o sistema climático da Terra. Por maior a exposição, poder, carisma, mitificação, santificação, babação e vassalos faça, nunca personagem da história algum, trágico ou bufo, soube o que estava fazendo e muito menos o resultado de sua vida, do ponto de vista social, foi obra intencional dele. Tal qual artistas, ou quaisquer, não sabem o que fazem". (Nestor - fimbrias de 1987)


(decodificação e rearranjo livre de idéias aparentemente esboçadas nos fragmentos 23 e 14 do Manifesto Social Decadente)